A régua errada pode destruir até quem vence

Existe uma história que gosto muito de contar. Não porque seja bonita, mas porque é brutalmente honesta sobre como a gente se sabota — mesmo depois de vencer.

Chris Paes

7/27/20253 min read

Existe uma história que gosto muito de contar. Não porque seja bonita, mas porque é brutalmente honesta sobre como a gente se sabota — mesmo depois de vencer.

No final dos anos 70, uma banda de metal californiana, ainda desconhecida do grande público, conseguiu algo raro: um contrato com uma grande gravadora. Era o tipo de oportunidade que milhares de bandas perseguiam, mas poucas conquistavam, ainda mais dentro de um estilo marginalizado e fora do radar do mercado.

Só que, poucos dias antes de entrar no estúdio, essa banda tomou uma decisão seca: expulsou um dos integrantes. Sem cerimônia. Sem segunda chance. Jogaram o cara pra fora com a mesma frieza com que se troca uma peça de equipamento.

Pra esse cara, foi um soco na alma. Ele estava prestes a realizar o sonho de qualquer músico — gravar um disco, lançar carreira, subir no palco grande — e, de repente, foi reduzido a ninguém. Humilhado. Excluído. Ferido.

Mas ele não desistiu.

Pelo contrário: transformou essa dor em gasolina. Jurou vingança. Disse a si mesmo que montaria uma banda melhor. Que gravaria mais discos, lotaria mais shows, teria mais fãs. Que um dia faria os ex-companheiros engolirem aquilo.

E ele foi.

Montou uma nova banda. Passou madrugadas compondo. Assinou com uma gravadora. Lançou álbuns. Criou legiões de fãs. Ganhou reconhecimento no mundo inteiro.

Vendeu mais de 25 milhões de discos. Recebeu indicações ao Grammy. Se tornou um ícone do metal.

Esse cara era Dave Mustaine, fundador do Megadeth. Um dos maiores nomes do heavy metal mundial.

Mas a banda que o chutou...

era o Metallica.

A maior banda de metal da história. Mais de 120 milhões de discos vendidos. Um império. Um fenômeno global. Um monumento da cultura pop.

E aqui está o ponto central da história: Dave venceu. Mas nunca conseguiu se sentir vitorioso.

Mesmo com tudo o que construiu, mesmo com uma carreira que 99,9% dos músicos do planeta jamais chegariam perto de alcançar, ele carregava uma sensação crônica de derrota. Porque o parâmetro dele nunca foi o que construiu. Era o que o outro alcançou.

E quando a régua é essa... nunca é suficiente.

Essa história não é sobre música. É sobre gente. Sobre você. Sobre mim. Sobre todos que já se viram com conquistas reais nas mãos e, ainda assim, sentindo que “faltava alguma coisa”.

Porque a comparação é uma armadilha elegante. Ela não grita. Ela sussurra:

"Sim, você conseguiu... mas olha o outro."

"Você ganhou, mas não ganhou tanto quanto ele."

"Você é bom... mas ele é melhor."

E quando isso se instala, o sucesso deixa de ser uma construção e vira uma competição. Uma eterna corrida sem linha de chegada. Uma maratona onde ninguém vence porque o critério muda o tempo todo. Onde as conquistas viram obrigação. Onde a vitória tem gosto de dívida.

É por isso que tanta gente que parece “vencer na vida” continua ansiosa, exausta, improdutiva. Porque a mente não consegue celebrar o que tem quando está ocupada demais se comparando com o que não tem.

A comparação desloca o eixo.

Você deixa de viver no seu tempo, com a sua verdade, e começa a se medir pelo ângulo torto do outro.

E isso é o caminho mais rápido pra construir muito — e não sentir nada.

Tem gente que chegou onde sempre sonhou...

e mesmo assim acha que tá atrás.

Tem gente que vence todo dia...

mas ainda carrega a sensação de que perdeu.

Porque, no fundo, tá jogando um jogo que nem sabe que entrou: o jogo de vencer mais que alguém.

E não o jogo de construir algo significativo com as próprias mãos.

Sucesso de verdade é paz.

Não é sobre ser maior. É sobre estar inteiro.

Não é sobre vencer mais. É sobre vencer com sentido.

É quando você olha pra trás e vê um caminho que tem a sua cara — e não um teatro montado pra provar algo pra alguém.

E isso não tem a ver com ganhar pouco ou pensar pequeno.

Tem a ver com saber o que te move de verdade.

Com celebrar o que construiu.

Com entender que talvez o que você tem já seja tudo que precisa.

Se a régua que você tá usando ainda é a do outro...

talvez o próximo passo da sua vida não seja mais um esforço.

Seja só a coragem de largar a régua. E continuar andando.